22/04/2008

"Vamos dedicar-nos totalmente à oração e ao ministério da Palavra"

À medida que a comunidade cristã crescia – e cada dia aumentava o número daqueles que abraçavam a fé, levantavam-se novos problemas e surgiam novas necessidades. Desta vez, os cristãos de origem grega reclamam que se preste mais atenção às suas viúvas.
Os apóstolos, sempre iluminados e movidos pelo Espírito Santo, procuram uma resposta adequada para as diferentes situações que vão aparecendo.
Neste caso, eles têm clara consciência de que o serviço aos irmãos necessitados não pode ser descuidado pela comunidade cristã. Mas também têm consciência de que não podem ser eles a fazer tudo. Serviços como o da caridade (o servir às mesas, o atender às viúvas e aos órfãos) podem ser garantidos por outros membros da comunidade. Nesse sentido, ordenam que sejam escolhidos sete homens – “homens de boa reputação, cheios do Espírito Santo e de sabedoria” – para lhes confiarem essa nova tarefa.
Deste modo, os apóstolos podem dedicar o seu tempo e consagrar a sua vida, total e radicalmente, ao que é o essencial da sua missão: a oração e o serviço da palavra. As múltiplas solicitações da comunidade cristã não desviam a atenção dos apóstolos do que é específico da sua missão!
Os apóstolos sabem que, para poderem proclamar, com fidelidade e com convicção, a palavra de Deus – o Evangelho de Jesus Cristo – precisam de passar muito tempo em oração. Eles precisam de escutar a palavra, de a meditarem no seu coração, de a tornarem realidade na sua vida.

“Vamos dedicar-nos totalmente à oração e ao ministério da palavra”.
Estas devem continuar a ser as prioridades da vida e da missão do sacerdote de hoje. E como seria bom que os cristãos também entendessem, aceitassem e respeitassem esta verdade!
  • O sacerdote não é, não pode ser reduzido (ele não pode consentir que o reduzam) a um mero profissional do religioso. Ele é, por vocação e missão, um homem de Deus, que proclama a sua Palavra, testemunha a sua vida e a comunica aos homens.
  • Por conseguinte, também ele, no seguimento e na imitação de Jesus, deve ser um homem de oração. Sem uma vida espiritual consistente, toda a acção pastoral do sacerdote, por mais variada e moderna que seja, é ineficaz e vã. Poderá ter muitas iniciativas e fazer muitas coisas, poderá trabalhar desde manhã cedo até noite dentro, mas se não age iluminado pela fé e movido pelo amor de Deus, cansar-se-á inutilmente, não ajudará a crescer o Reino de Deus.

O sacerdote:

  • precisa de entrar na intimidade de Deus, dialogando com Ele;
  • precisa de experimentar a intensidade da sua vida e do seu amor, deixando-se maravilhar por Ele;
  • precisa de escutar a sua palavra, perscrutar os seus desígnios, aceitar a sua verdade, acolhê-lo no seu coração. Só assim, o sacerdote poderá dedicar-se, de alma e coração, com credibilidade e eficácia, ao ministério da Palavra.

Caso contrário, o sacerdote torna-se num “pregador vão e superficial da palavra de Deus”. Quando falta a vida interior, o sacerdote, ainda que programe e se empenhe em muitas actividades pastorais, sentir-se-á insatisfeito e infeliz.

“ … totalmente ao ministério da palavra”.

O serviço da palavra, sempre precedido e acompanhado pela oração, constitui a prioridade do ministério sacerdotal. O sacerdote realiza esta sua missão:

  • quando proclama e explica, actualizando-a para o hoje da comunidade cristã que a escuta, a palavra de Deus, durante as celebrações litúrgicas;
  • quando implementa, organiza e apoia a catequese paroquial;
  • quando acolhe e escuta as pessoas, iluminando as suas dúvidas, os seus problemas e as suas inquietações existenciais com a luz da palavra de Deus;
  • quando, á luz desta mesma palavra de Deus, interpreta e ilumina, para as ajudar a transformar positivamente, todas as realidades humanas, familiares e sociais.
  • O sacerdote está ao serviço da palavra, quando celebra a Eucaristia. Esta é o momento privilegiado da proclamação e escuta da palavra de Deus. Porém, isto não implica, muito pelo contrário, que o sacerdote a deva celebrar a toda a hora e em todos os lugares. De outro modo, não lhe restaria tempo para rezar! E muitos cristãos bem pouco se importariam com isso!
  • Também está ao serviço da palavra, quando celebra o Baptismo, preside aos casamentos ou às exéquias fúnebres. No entanto, não tem que ser ele a fazer tudo isso. Todas estas celebrações podem ser garantidas pelos diáconos ou mesmo por leigos devidamente mandatados para tal. E o mesmo se pode dizer das procissões e outras devoções religiosas, para já não falar no que se refere ao Cartório Paroquial.

Se o sacerdote tem de fazer tudo, como muitas pessoas querem e exigem, onde vai encontrar tempo para rezar e para se preparar devidamente para o que é específico do seu ministério?
Por vezes, fico com a impressão de que as pessoas não se preocupam muito com isso, ou seja, não se preocupam se o padre tem ou não tem tempo para rezar e para se preparar, ou se efectivamente reza e se prepara. O que parece ser importante para elas é que, no momento em que precisam de um qualquer serviço religioso, o padre esteja disponível e seja ele a realizá-lo. E se o padre as atende como desejam, consideram, pelo menos naquele momento, que é um bom padre, um padre como deveriam ser todos os outros.

Mas se o padre faz tudo e faz tudo como as pessoas querem, mas faz tudo de qualquer modo, sem espírito nem verdade, como pode ser bom padre? Mas será que as pessoas querem bons padres, padres apostólicos, padres como Jesus?

Que nenhum padre se iluda, pois não faltarão aqueles que darão conta da contradição da sua vida e o começarão a censurar, dizendo:

  • até pelo modo como fala, dá a entender que não acredita no que ensina (“vê-se mesmo que está a fazer um frete);
  • diz uma coisa, mas faz outra (quem o pode tomar a sério!);
  • a sua vida carece de consistência e de coerência (não é exemplo para ninguém);
  • foi para padre só para governar a vida (não tinha jeito para mais nada)!

E ainda dizem outras coisas piores …!

Para evitar estes escolhos, “Vamos (também nós) dedicar-nos totalmente à oração e ao ministério da Palavra”. Apesar de serem muitas as propostas pastorais feitas pelas estruturas diocesanas, apesar de serem muitas as solicitações e as exigências dos paroquianos, apesar de vivermos no tempo da agitação e da pressa, não podemos prescindir do tempo necessário à oração. Caso contrário – estamos conscientes disso - deitaremos tudo a perder, trabalharemos e cansar-nos-emos em vão.
E os cristãos ser-nos-ão de grande ajuda se eles levarem a sério a recomendação que lhes faz, hoje, São Pedro. “Como pedras vivas, entrai na construção deste templo espiritual …” Se os cristãos viverem como pedras vivas, ou seja, como cristãos conscientes e empenhados, se puserem a render os dons recebidos de Deus, se realizarem a missão que lhes compete no seio da Igreja, então os sacerdotes terão mais tempo para o que é mais importante, poderão realizar melhor a sua missão. E todos nós (sacerdotes e leigos) e a Igreja no seu todo só teremos a lucrar com isso.

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